[b]Divisão do Pará: Marajó retoma debates
A revisão geopolítica do Estado do Pará, mais uma vez, será o centro das discussões da bancada federal do Estado no Congresso Nacional. E, desta vez, com um novo ingrediente: a proposta de criação do Território Federal do Marajó, ressuscitada de um antigo projeto de Decreto Legislativo, datado de 2002, proposto pelo ex-deputado Benedito Dias, do PPB do Amapá. Quem faz pressão agora pelo retorno da proposta são os prefeitos e lideranças políticas do arquipélago, capitaneados pelo bispo Dom Luiz Azcona, da Prelazia do Marajó.
O bispo e as lideranças marajoaras defendem a retomada do projeto que, em 2006, teve uma nova tentativa de discussão, desta vez por parte da então deputada federal Ann Pontes (PMDB). Na época a deputada integrava a Comissão da Amazônia, Integração Nacional e de Desenvolvimento Regional e solicitou a realização, na sede da Assembleia Legislativa do Pará, de uma reunião de debates da comissão.
O objetivo seria reunir deputados federais, estaduais, representantes da Associação dos Municípios da Ilha do Marajó (AMAM), da Universidade Federal do Pará (UFPA), bem como todos os prefeitos e vereadores dos municípios do arquipélago do Marajó e representantes dos Sindicatos de Produtores do Marajó para discutir o projeto de Decreto Legislativo apresentado em 2002 pelo deputado amapaense.
O projeto, que se encontra arquivado na Câmara dos Deputados, pode ser apresentado a qualquer momento por qualquer outro deputado que se dispuser a defender esta bandeira. E mediante os relatos feitos pelas lideranças políticas do Marajó, é muito fácil ser convencido de que a única salvação para acabar com o isolamento do arquipélago é mesmo permitir que ele receba repasses diretos da União.
De acordo com o projeto, seria realizado um plebiscito nos 16 municípios que integram o arquipélago marajoara para a criação do Território Federal do Marajó. Com a aprovação, um projeto de Lei Complementar seria apresentado para, desta vez, promover a criação definitiva do território.
As vantagens para a região seriam imediatas e, possivelmente, solução para os maiores problemas da região, conforme justifica o autor do projeto. Segundo o documento arquivado na Câmara, o reflexo imediato seria acabar com o isolamento político-administrativo da região devido à sua distância geográfica. “O desmembramento implicará, necessariamente, na efetiva integração ao restante do país e, sobretudo, obriga a uma efetiva atuação dos poderes constituídos”.
APARTADO
O Marajó possui uma área que abriga 16 municípios que juntos alcançam a extensão territorial de 104.606,9 quilômetros quadrados. Equivale a países como a Holanda e a Bélgica, juntas. A população ultrapassa 450 mil habitantes. O arquipélago apresenta, além da vocação agropecuária, um potencial turístico inexplorado.
Mas, apesar de tudo isso, a Ilha de Marajó está mergulhada na pobreza, em meio a um mar de dificuldades e abandono. As deficiências vão dos transportes e saúde à educação, incluindo a falta de um hospital regional, cuja construção foi concluída no município de Breves, mas que até hoje não entrou em funcionamento.
A distância média de Belém de seus municípios, por via fluvial, é percorrida em média por 36 horas - o que faz com que quase sempre as pessoas recorram ao município de Macapá, que acaba sendo bem mais próximo.
Foram esses os principais motivos defendidos pelas lideranças políticas e pelo bispo Dom Luiz Azcona, que justificam a defesa da transformação da região em Território Federal. Transformado em território, o Marajó passaria a ter representatividade no Congresso Nacional, com três senadores e oito deputados federais, podendo receber recursos diretamente da União, tornando-se totalmente independente do Pará.
Mitos desfeitos sobre divisão
“É mais uma causa utópica que se abre para dividir ainda mais a população do Pará. Ou nos dividimos ou nos unimos para sempre. O que não podemos é manter a cada mudança política, a cada início de ano político esta discussão sobre o fracionamento do Estado,” vaticina o deputado José Priante. Ele retorna para um novo mandato na Câmara dos Deputados, e mais uma vez revive o clima da discussão sobre o fracionamento do Estado.
Defensor da realização de plebiscito para a criação dos estados do Carajás e do Tapajós, Priante defende que as discussões sobre a revisão geopolítica do Pará devem chegar a um consenso, sob o risco de romperem-se as relações políticas. “Criam-se embaraços nas relações políticas, criam-se barreiras intransponíveis. É preciso ter uma solução para estas questões. Não dá para viver no ‘faz-de-conta”, afirma.
Nesta nova legislatura o caminho pela aprovação do plebiscito parece estar mais aberto e fácil já que seus principais opositores, os deputados Zenaldo Coutinho e Nilson Pinto, ambos do PSDB paraense, se licenciaram para ocupar secretarias no governo Simão Jatene. Os dois projetos de Decreto Legislativo já estiveram na pauta de votação da Câmara no final do ano passado, mas não chegaram a ser votados.
Um dos principais defensores do fracionamento do Estado, o deputado Giovanni Queiroz, é o novo líder do PDT na Câmara. O cargo dá a ele poderes para negociar no colégio de líderes a inclusão dos projetos do plebiscito na pauta de votação do plenário, que ele pretende incluir em abril.
MITOS
Giovanni relembra que a proposta concretiza um desejo da população do Sul e do Sudeste do Pará. Ele apresentou na quinta, 10, no Auditório da FAEPA em Belém, o Estudo de Viabilidade de criação do Estado de Carajás “Assimetrias Regionais no Brasil: Fundamentos para Criação do Estado do Carajás”, de autoria do economista Célio Costa. O estudo foi bancado pela Associação dos Municípios do Araguaia, Tocantins e Carajás – AMAT.
O estudo traz uma radiografia completa da situação política, econômica, social e geográfica dos 39 municípios. Derruba também alguns mitos, como a questão do ICMS, conforme texto extraído do autor: “A concluir pelo que revelam dois principais indicadores de riqueza, o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços, maior fonte de recursos próprios dos estados, e pelo Produto Interno Bruto, principal indicador de riqueza econômica regional, vê-se que alguns mitos que ganharam força entre lideranças políticas e empresariais paraenses são refutados pelo que expressam os números oficiais: o mito difundido no sul-sudeste paraense [Carajás] de que esta região é a principal fonte de receita fiscal do governo estadual, o mito de que a sub-região Carajás representa a parte mais rica do estado”.
Aina segundo o estudo, as evidencias estatísticas, entretanto, dão conta de que cientificamente essas concepções não se sustentam, pois na RMB estão concentrados mais da metade do PIB e do ICMS paraenses. Disso resulta que mesmo após a emancipação de Carajás, o Pará remanescente ficará com 71% do PIB e 72% do ICMS, fato que mostra que o governo paraense não será abalado em suas finanças, mesmo porque este terá sua área e população reduzidas e, consequentemente, terá reduzido também seus gastos com o custeio da máquina administrativa e das funções públicas que visam atender a população.
O autor também destaca que o novo estado do Pará ficará desonerado de investir volume considerável de recursos em infraestrutura econômica e social que necessitaria aplicar na sub-região a ser desmembrada, cuja demanda social e econômica “o atual governo paraense não tem conseguido atender adequadamente”.
Queiroz defendeu o desmembramento do Pará e citou o exemplo de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, divididos há 33 anos. Ele afirmou que o crescimento do Produto Interno Bruto dos dois estados tem sido muito superior ao do PIB nacional. “Se falarmos em qualidade de vida, então, é extraordinário. São milhões de empregos, aumento da produção e criação de riqueza para o povo da região”.
O deputado lembrou ainda Tocantins, desmembrado de Goiás. Ele afirmou que a região era um “corredor da miséria” e hoje a situação é diferente. Queiroz afirmou que, comparando o sul do Pará, que fica à margem esquerda do rio Araguaia, com o Tocantins, à direita, a diferença é absoluta. Ele afirmou que Tocantins, com 1,3 milhão de habitantes, possui quatro faculdades de Medicina. Já o sul do Pará, com quase 1,5 milhão de habitantes, não tem nenhuma.
“O desmembramento favorece o desenvolvimento do País e a diminuição das desigualdades regionais”, disse. O parlamentar ainda argumenta: desmembrar estados é uma forma de atender de forma equânime a população e permitir uma vida digna mesmo morando no interior.
Parlamentares listam as mais diversas posições
Os deputados que chegam à nova legislatura têm opiniões divergentes sobre a divisão do Pará. Curiosamente, o tucano André Dias (PSDB) é contra a realização de plebiscito e favorável ao desmembramento do Estado. Mas ele explica colocação: “Não devemos realizar um plebiscito sem que exista um estudo que de fato respeite uma série de circustãncias que ainda não foram levadas em conta, como cadeias produtivas, econômicas, de logística, de meio ambiente, entre outros fatores”.
André Dias questiona, por exemplo a localização do município de Tucuruí: “Tucuruí deve ficar no Carajás? Por que razão? Em qual cadeia produtiva está inserida se a principal interferência é do rio Tocantins?”.
Por sua vez, Arnaldo Jordy (PPS) é favorável ao plebiscito. “É uma consulta democrática, deve acontecer. O povo deve ser ouvido”. Mas o deputado pondera: “Precisamos pensar no Pará inserido na região amazônica como um todo. Nossa participação no PIB brasileiro é muito baixa. Dividir com esta pouca participação é manter a mesma agenda negativa, é dividir miséria e pobreza”.
Cláudio Puty (PT) tem a mesma opinião. É também favorável ao plebiscito mas acredita que o formato da revisão geopolítica do Estado deve ser revisto. Ele lembra também que há no processo a necessidade de se consultar o Governo Federal, já que o ano de 2011 inicia-se com o corte de gastos e uma redivisão implica em custos.
O deputado Dudimar Paxiúba (PSDB) é da região do Tapajós e conhece a realidade local. Assim como os principais defensores do processo, os deputados Lira Maia (DEM), Lúcio Vale (PP), Wandenkolk Gonçalves (PSDB) e Zequinha Marinho (PSC), o estreante promete fazer mobilizações pela aprovação do plebiscito.
Josué Bengtson (PTB) lembra que sempre foi favorável à consulta popular, mas destaca que os estudos de viabilidade técnica e econômica devem ser muito bem fundamentados para que todas as regiões se desenvolvam de forma equânime. “A criação do estado do Tocantins é um bom exemplo a ser seguido. Mas para isso é necessário que os estudos estejam bem fundamentados”.
NA CONTRAMÃO
Curiosamente, em meio a tanta polêmica sobre a redivisão do Pará, o deputado Wladimir Costa (PMDB) apresentou, em 2004, um Projeto de Decreto Legislativo propondo a realização de um plebiscito em todos os municípios do Pará e do Amapá para que a população se manifestasse sobre a incorporação do Estado do Amapá ao Pará.
Na justificativa, Costa lembrava que a região já foi incorporada ao Pará, até que, em 1943, foi transformada em território federal, e em Estado, com a promulgação da Constituição Federal de 1988.
Para Costa, a unificação dos dois Estados racionalizaria os esforços realizados pelas esferas federal e estadual, visando ao
desenvolvimento econômico e social da região.
O projeto foi apresentado à Mesa Diretora da Câmara dos Deputados em fevereiro de 2002, mas, por contrariar o Regimento Interno da Câmara, não chegou a tramitar em nenhuma comissão de mérito e acabou sendo arquivado dois meses depois. (Diário do Pará)
Nenhum comentário:
Postar um comentário