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sexta-feira, 1 de janeiro de 2016

A NOVELA DA INSTALAÇÃO DO MUNICÍPIO DE EXTREMA DE RONDÔNIA

A primeira tentativa de emancipação da Ponta do Abunã foi encabeçada pelo ex-deputado federal Reditário Cassol através do projeto 153/88. Na época a região denominar-se-ia Município Tancredo Neves, em homenagem ao presidente que não chegaria a assumir a Presidência da República. O plebiscito ainda foi marcado e realizado, mas as urnas tiveram que ser isoladas no distrito de Vista Alegre do Abunã, local onde quem possuía título do TRE-RO sempre votava na época. Partidários do Acre realizaram intensa campanha para que os eleitores não fossem às urnas, e por uma diferença de aproximadamente 14 votos a região perdeu a oportunidade de emancipar-se. Desta feita o Estado de Rondônia através da mesa diretora da Assembléia Legislativa propôs realizar uma nova consulta popular, baseando-se novamente na malograda criação do município Tancredo Neves, atual área denominada Ponta do Abunã, através do decreto legislativo nº. 86 de 15 de março de 1993. Neste período a corte do TRE-RO, indefere pedido de realização do plebiscito face ação cível originária que tramitava no Supremo Tribunal Federal, sobre os estados litigantes. O golpe final que praticamente asfixiava a vontade popular de emancipar a Ponta do Abunã viria através da emenda constitucional nº. 15, de 12 de setembro de 1996.
Cansados de esperar pela tão sonhada emancipação, a população da Ponta do Abunã parte para a ofensiva, e através de um maciço movimento popular resolve bloquear a BR 364, exigindo das autoridades competentes uma solução definitiva para uma questão que já durava mais de vinte anos. Observemos que o movimento popular pela emancipação da Ponta do Abunã surgiu da idéia que a partir daquele momento era preciso não só "Pressionar" o judiciário, mas também o legislativo, visto que a ausência de uma regulamentação constitucional terminava por prejudicar a autonomia de toda uma coletividade. Era madrugada da manhã do dia 03 de agosto de 2009. O povo bloqueia a BR 364 no distrito de Extrema, exigindo a realização do plebiscito e objetivando a sua emancipação. Vários segmentos da população estavam presentes, homens, mulheres e crianças aglomeravam-se sob o sol ardente. Às margens da BR foram construídas barracas cobertas de palhas ou lonas. O movimento ganhou força com a chegada do povo indígena Kaxararí, que participou ativamente do bloqueio. Pecuaristas doaram bois para que os manifestantes se alimentassem no local, evitando assim a dispersão do povo. Comerciantes doavam alimentos, a comunidade ajudava como podia e a manifestação foi ganhando mais força com a chegada de agricultores que chegavam de todos os ramais da região. Toras de madeira obstruíam a rodovia, faixas exigindo justiça foram espalhadas por toda parte, um serviço de som foi montado para animar os manifestantes e para servir de comunicação entre eles. A rodovia ficou iluminada, um grande refeitório fora improvisado. A comunidade estava decidida a não desobstruir a BR, enquanto as autoridades não comparecessem para negociar com os manifestantes e encontrar uma solução para o impasse. O movimento se desenrolou de forma pacífica no primeiro dia. Parecia que o movimento popular seguiria sem violência e que finalmente tudo seria resolvido sem que houvesse um confronto entre manifestantes e policiais rodoviários federais. Os ânimos foram se acirrando e uma equipe do movimento decide fechar todos os órgãos oficiais e privados do distrito de Extrema, e assim o fizeram. O movimento chega ao seu terceiro dia. Uma extensa fila de veículos foi formada. O cansaço entre manifestantes e caminhoneiros era visível. Felizmente não houve confronto entre as partes, pois grande parte dos caminhoneiros presentes aderiu ao movimento, fortalecendo ainda mais a manifestação.
 Diante de tão conflituosa situação e já no entardecer do dia cinco de agosto, chega a BR 364 um contingente aproximado de 40 policiais da PRF/NOE de Rio Branco-AC e de Porto Velho. Num palanque improvisado pelos manifestantes e fazendo uso do serviço de som instalado no local, o inspetor Getúlio da PRF-AC e o inspetor Alvino da PRF-RO, buscam negociar o desbloqueio da BR com integrantes do movimento. Os manifestantes solicitavam a presença de autoridades estaduais e federais para que a negociação tivesse êxito. Não havendo acordo entre as partes, os policiais rodoviários se afastaram da BR caminhando sentido Acre. Todos achavam que os mesmos poderiam estar abandonando a rodovia para que as negociações pudessem ser retomadas no dia seguinte, visto que já eram dezoito horas e trinta minutos, horário considerado inadequado para a realização de uma operação considerada delicada, principalmente porque havia muitas crianças no local e já estava quase anoitecendo. De repente escutam-se estampidos de tiros de balas de borracha e a PRF inicia o confronto. O confronto entre manifestantes e o contingente da PRF ganhou repercussão nacional e ficou conhecido como "A batalha de Extrema". No enfrentamento saíram feridos populares e policiais. Um policial que ficou gravemente ferido foi socorrido numa residência próxima ao conflito e em seguida levado ao Hospital Regional de Extrema para ser medicado. Felizmente não houve perda no confronto. A manifestação cresceu rapidamente e o número de manifestantes chegou a aproximadamente quatro mil pessoas. A comunidade enfurecida insistia em manter-se na BR até que as autoridades comparecessem no local do conflito. Finalmente algumas autoridades compareceram durante a noite no movimento, dentre elas o senador Valdir Raupp e o chefe da casa militar do Estado de Rondônia, tenente coronel/PM Sávio Borges Lessa. Durante reunião realizada na delegacia de Extrema, constituiu-se uma comissão para ir à Brasília no intuito de conseguirem a realização do plebiscito. Finalmente a rodovia foi desbloqueada e a paz voltou a reinar na Ponta do Abunã.
 Imediatamente o Ministério da Justiça através da Portaria Nº 2.680 de seis de agosto de 2009, e considerando a manifestação do Departamento de Polícia Rodoviária Federal através do Memorando N° 148/2009 da CGO/DPRF, determina o imediato emprego da Força Nacional de Segurança Pública no distrito de Extrema de Rondônia.
No dia 10 de agosto de 2009 o movimento pró-emancipação da Ponta do Abunã, divulga nota oficial sobre a manifestação ocorrida durante os dias três a cinco de agosto. Na referida nota o movimento pró-emancipação denunciou a falta de políticas públicas para a região e negligência do Estado frente às necessidades básicas essenciais a população. Apontam que o movimento foi programado há mais de noventa dias e que todas as autoridades estaduais e federais foram notificadas, visto que a comunicação sobre um possível bloqueio da BR poderia sensibilizar as autoridades no sentido de evitar o referido fechamento, caso houvesse a boa vontade destas autoridades em marcarem uma data para a realização do plebiscito. Na nota diz-se, ser inadmissível uma região tão rica e promissora ainda não ser um município autônomo de fato e de direito em virtude da falta de regulamentação de uma lei complementar federal, enquanto sabe-se que no país foram criados 57 novos municípios à revelia da lei. Apesar da onda de violência ocorrida durante o bloqueio da BR, houve um saldo positivo alcançado pelo movimento popular, pois se agendou uma audiência com o ministro Fernando Gonçalves do Tribunal Superior Eleitoral – TSE, em Brasília, para o dia 13 de agosto de 2009.
Finalmente o TRE-RO através da resolução número 24, de 29 de setembro de 2009 fixa regras e data para consulta plebiscitária na Região da Ponta do Abunã, mas logo em seguida, outra frustração, o Ministério Público Eleitoral impetrou mandado de segurança contra a decisão do Tribunal Regional. Na liminar o MPE argumenta que a consulta não poderia ser realizada apenas nos distritos que compõe a Ponta do Abunã, no caso a parte interessada, mas teria que envolver também a parte envolvida, no caso todos os eleitores do município de Porto Velho. O Ministério Público Eleitoral fundamentou-se principalmente no decreto legislativo número 226 de 19 de julho de 2007 que limitava a realização da consulta plebiscitária apenas nos Distritos de Extrema, Nova Califórnia, Vista Alegre e Fortaleza do Abunã, para se criar o futuro município de Extrema de Rondônia.
Inicialmente o plebiscito estaria marcado para o dia 08 de novembro de 2009, mas diante da liminar, novamente teve que ser adiado. A decisão da liminar foi votada pelo TSE em 13 de outubro de 2009, através do mandado de segurança número 4256. O Ministério Público Eleitoral sustentava que a referida resolução violava os artigos 1° e 14 da Constituição Federal, bem como o artigo 7° da lei 9.709/98, ao se excluir os demais eleitores residentes no município de Porto Velho da consulta plebiscitária. Entendia o ministro e relator do TSE, Fernando Gonçalves, que o artigo 7° deixa explícito que a consulta deverá ser destinada tanto à parte que se pretende desmembrar como à parte que sofrerá o desmembramento, e resolve então conceder a liminar, suspendendo os efeitos da resolução n°24/2009 do TRE/RO, até ulterior deliberação. Desta feita e atendendo solicitação do TRE, o Tribunal Regional Eleitoral - RO, através da resolução n°35 de 10 de dezembro de 2009, aprova nova consulta plebiscitária n° 3392 - classe 42, para 28 de fevereiro de 2010. O egrégio tribunal no uso de suas atribuições legais e regimentais considerou o disposto no inciso I do artigo 14 da Constituição Federal, o disposto do decreto legislativo número 226 de 19 de julho de 2007, a decisão exarada do mandado de segurança número 4256/2009 - TSE, que determinou o estendimento da consulta plebiscitária a todo município de Porto Velho, e por fim, ao cumprimento do acórdão TRE/RO número 504 de 18 de setembro de 2007, que autorizou a consulta plebiscitária requerida pela Assembléia Legislativa do Estado de Rondônia.
A consulta plebiscitária foi considerada na forma da lei como uma eleição normal, igualmente a qualquer outra já realizada no país, os eleitores aptos a votar, por exemplo, deveriam estar domiciliados na área consultada até 30 de setembro de 2009, e a proposta de emancipação será considerada aprovada se obtiver o voto favorável da maioria dos eleitores que comparecessem às urnas. Com relação às frentes suprapartidárias organizadas em torno da consulta plebiscitária deveriam comunicar ao juiz eleitoral competente, vinte dias antes da realização do plebiscito, assim como, seria livre a propaganda em todas as suas formas de acordo com os trâmites legais. Importante acrescentar que o eleitor teria que optar pela tecla que correspondesse à sua intenção de voto, no caso, o número 55 para dizer sim a emancipação e o número 77 para dizer não. O dia 23 de fevereiro de 2010 seria o ultimo dia de prazo para as frentes suprapartidárias registrarem os nomes das pessoas autorizadas a expedir as credenciais dos fiscais e para apresentarem o modelo de credenciamento a ser utilizado. O dia 26 de fevereiro foi o ultimo dia de prazo para a entrega do material da votação aos presidentes de mesas receptoras de votos e finalmente o dia 28 de fevereiro de 2010 seria o grande dia, considerado uma data histórica para toda população da Ponta do Abunã.
A campanha foi considerada intensa e muito desgastante por parte da população. Todos os seguimentos da sociedade se uniram em nome de um propósito único: Todos queriam a emancipação do distrito de Extrema de Rondônia, mas para que esse objetivo maior fosse conseguido era preciso que a população conseguisse a maioria do “sim” nas urnas, para que o povo pudesse continuar sonhando com a criação do que seria o 53° município do Estado de Rondônia. Todos se empenharam decisivamente na campanha do “55”, o movimento popular pela emancipação percorreu todos os bairros de Porto Velho, sites, televisão, rádios, partidos políticos, entidades governamentais e não governamentais, objetivando a concretização de um sonho que parecia não muito distante. O exemplo desta histórica união foram as escolas da região, que tiveram papel importante na conscientização da população. Professores, alunos, servidores em geral, mostraram sua força nas ruas e pediram de forma aguerrida a vitória do “sim”. Finalmente é chegada a hora e a população vai às urnas no dia 28 de fevereiro de 2010. A eleição se encerra e o povo vibra com o resultado obtido nas urnas. O “sim” vence com uma vitória esmagadora de 90,21 % dos votos válidos. Foram 170.004 votos para o sim, contra 18.853 para o não. (TRE-RO/2010). O sentimento de vitória trouxe muita alegria ao povo de toda região, uma imensa carreata foi realizada, percorreu-se todas as ruas de Extrema, o barulho de fogos ecoou por toda noite e a festa parecia não ter fim. Esperava-se agora a instalação do tão sonhado município de Extrema de Rondônia.
Diante de tão histórica e expressiva vitória do “sim” na consulta plebiscitária realizada no dia 28 de fevereiro de 2010, imediatamente a Assembléia Legislativa do Estado de Rondônia, aprova no dia 16 de março do mesmo ano a criação do município de Extrema de Rondônia e o conseqüente desmembramento do município mãe, Porto Velho. A lei n°2264 foi sancionada em 17 de março de 2010. Curiosamente, ainda no mesmo mês, o Ministério Público Federal em Rondônia apontou irregularidade na referida lei argumentando sua inconstitucionalidade devido à falta de regulamentação de uma lei complementar federal que regulamentasse a emenda constitucional 15/96 que atualmente ainda tramita no Congresso Nacional. O mais impressionante é que dois dias depois em que foi editada a lei 2264 pela ALE-RO, mais precisamente em 19 de março de 2010, o governador Ivo Narciso Cassol juntamente com toda a sua comitiva, lotou um ginásio de esporte no Distrito de Extrema e num ato histórico, na presença de uma grande massa que assistia ao espetáculo, sancionou a nova lei de criação do mais novo município do Estado de Rondônia. Estava criado naquele momento o 53° município do Estado, que passava a ser denominado: Extrema de Rondônia. Mas a sua implantação de fato, ainda passaria por muitos entraves.
Esperançoso, o povo ainda sonha com a implantação do município no Governo Confúcio Moura. A esperança pode ser traduzida num trecho extraído da matéria “Eleições 2010 e a emancipação de Extrema de Rondônia”, de autoria de José Hermeto Mazurkewicz, o saudoso e popular Zé Gaúcho: “ O ex- governador Ivo Cassol com seu vice, o atual mandatário do palácio Getúlio Vargas, em solenidade pomposa em Extrema em 19 de março de 2010, sancionaram a lei que criou o município, como se estivessem participando duma brincadeira de meninos. A platéia presente imaginara que o governador se derramara em paixão por Extrema, pois o mesmo exibiu e passou às mãos de um líder arteiro sua caneta de estimação dizendo: ‘ Com esta caneta administrei dois mandatos na prefeitura de Rolim de Moura e estou completando dois mandatos de governador do Estado’. Talvez, naquele momento a platéia presente não imaginara que Cassol pressentira que acabou a tinta da caneta, fato constatado no primeiro autógrafo que o líder blindado pensou autografá-lo. Pode parecer piada de mau gosto, mas todos que presenciaram podem atestar. Os eleitores da Ponta do Abunã e de Porto Velho que participaram do plebiscito em 28 de fevereiro de 2010, desconfiam que foram enganados.”
No dia 14 de maio de 2011 é realizada uma audiência pública no Distrito de Extrema para discutir com a população a imediata implantação do futuro Município de Extrema de Rondônia. A reunião iniciou aparentemente tranqüila, mas logo que se iniciaram os pronunciamentos dos coordenadores do movimento, a discussão acirrou-se em torno de um novo bloqueio da BR 364. Aparecido Bispo de Oliveira, Um dos líderes do movimento do bloqueio da rodovia federal que culminou com a realização do plebiscito, disse que se até o dia 30 de julho do corrente ano, o Município não for implantado, a comunidade irá bloquear novamente a BR 364 no distrito de Extrema. A resposta a decisão do movimento pró-emancipação de fechar novamente a Rodovia federal foi imediata. A justiça Federal imediatamente convoca todos os líderes do movimento que bloquearam a BR em agosto de 2009 para uma audiência na sede do Fórum Cível Federal em Porto Velho no dia 28 de junho de 2011. Todos os líderes do movimento foram ouvidos neste dia e em seguida liberados. No entanto parte da comissão ficou em Porto Velho para tentar uma audiência com o Governador do Estado Confúcio Moura, objetivando receber um parecer do Governador a respeito da implantação do Município.
No dia 30 de junho de 2011, o mais notável líder do movimento pró-emancipação de Extrema de Rondônia, o popular Zé Gaúcho, foi vítima de um acidente fatal na BR 364 próximo a Porto Velho. A comunidade de toda Região da Ponta do Abunã, perdeu o seu mais autêntico líder que sempre lutou incansavelmente pela autonomia política do braço ocidental do Estado de Rondônia. Em 02 de julho, dois dias após o falecimento de José Hermeto Mazurkewicz - Zé Gaúcho - o Governador Confúcio Moura esteve em Extrema e lamentou a morte do líder comunitário. Em seguida anunciou que ainda no dia primeiro de julho já constava no diário oficial do Estado a nomeação de um assessor especial da casa civil para dar início aos levantamentos oficiais objetivando a implantação do município de Extrema de Rondônia. Através do Decreto Nº 12019 de 30 de junho de 2011, o Governador nomeou o servidor Hiran Pinto Castiel, assessor especial da Secretaria de Estado de Assuntos Estratégicos, com vistas a proceder a estudos que possam fundamentar a implantação do município de Extrema de Rondônia. Feito os estudos, o Governo do Estado encaminha solicitação ao Tribunal Superior Eleitoral – TSE para parecer daquela corte objetivando assegurar a realização de eleições municipais em Extrema de Rondônia. Mas infelizmente, no dia 10 de abril deste ano, o TSE publica a decisão unânime Nº 161/2012 que versa sobre a impossibilidade de instalação do município. Atualmente o povo ainda corre atrás deste sonho.
MATÉRIA PUBLICADA NO JORNAL RONDÔNIAOVIVO

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